Com o envio da denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas para o Supremo Tribunal Federal (STF), caiu o sigilo da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid.
Nas conversas com a Polícia Federal (PF), o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro fez revelações sobre detalhes da suposta trama golpista e menções aos casos da venda das joias sauditas do ex-presidente e fraude em cartões de vacina.
Segundo Moraes, o sigilo da delação já não é mais necessário "nem para preservar os direitos assegurados ao colaborador, nem para garantir o êxito das investigações" – até então, as defesas dos suspeitos se queixavam de não terem tido pleno acesso ao documento.
Veja, abaixo, os principais pontos da delação de Cid.
Bolsonaro e a minuta do golpe
Com base na delação de Mauro Cid, a Polícia Federal (PF) atribui ao ex-assessor especial de Assuntos Internacionais Filipe Martins a autoria de um primeiro esboço da chamada "minuta do golpe", um documento apresentado a Bolsonaro com propostas para subverter a ordem democrática.
O documento previa a prisão de diversas autoridades, incluindo a dos ministros do STF Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, além da prisão do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. À PF, Cid disse que Bolsonaro discutiu o documentocom a cúpula das Forças Armadas.
O ex-auxiliar afirma ter visto o presidente editar o texto, mantendo apenas dois pontos principais: a prisão de Moraes e a realização de novas eleições. Segundo Cid, o próprio Bolsonaro teria apresentado a minuta ao então comandante de Operações Terrestres do Exército, general Estevam Theophilo, numa reunião em 9 de dezembro de 2022.
De Theophilo, Cid teria ouvido que as Forças Armadas cumpririam o decreto caso Bolsonaro o assinasse.
Dinheiro de Braga Netto
À PF, Cid também incriminou o ex-ministro da Defesa e candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro em 2022, general Braga Netto. O ex-auxiliar disse ter recebido dinheiro dele no Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente da República.
A verba, entregue dentro de uma sacola de vinho, teria sido repassada ao militar Rafael Martins de Oliveira, do grupo "kids pretos", e seria destinada à organização das ações do golpe.
Família de Bolsonaro dividida sobre golpe
Segundo o blog da Andréia Sadi, no G1, Cid apontou que os planos golpistas não seriam unanimidade na família Bolsonaro. Enquanto o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) era contra um golpe de Estado, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) apoiava a ideia e era um de seus mais radicais defensores, assim como a ex-primeira dama, Michelle Bolsonaro.
Bolsonaro teria agido para evitar prisão de apoiadores
Cid também afirmou que Bolsonaro abrigou dois influenciadores bolsonaristas no Palácio da Alvorada e ordenado o transporte de um terceiro, o blogueiro Oswaldo Eustáquio, num carro da Presidência, para evitar que eles fossem presos.
Os três estavam acampados em quartéis e teriam ligado para o ex-presidente para pedir ajuda após um outro militante bolsonarista, o cacique Serere Xavante, ser detido por tentar invadir a sede da PF.
Bolsonaro e a desconfiança nas urnas eletrônicas
Segundo Cid, Bolsonaro sempre alimentou desconfiança sobre as urnas eletrônicas, e o "gabinete do ódio" fazia parte dessa estratégia.
O militar afirma que a estrutura que operava de dentro do Palácio do Planalto era formada por "três garotos" e gerida por um dos filhos do presidente, o vereador carioca Carlos Bolsonaro (PL-RJ). "Era o Carlos quem ditava o que eles teriam que colocar."
Para fazer o conteúdo reverberar nas redes, o grupo recorria a influenciadores ligados ao presidente, que atuavam como multiplicadores da pauta bolsonarista.
Cartão de vacinação da Covid falsificado a mando de Bolsonaro
Embora não tenha se vacinado contra a covid-19, o ex-presidente teria dado ordens para a falsificação de certificados de imunização em nome dele e de sua filha, para usá-los em caso de necessidade, como viagens internacionais.
Pouco antes de deixar a Presidência, Bolsonaro viajou para os Estados Unidos, no dia 30 de dezembro, com a esposa e a filha. Mas, como ele viajou com passaporte diplomático, não precisaria, de acordo com as regras americanas, apresentar comprovante de vacinação.
Venda de presentes
Cid afirmou ainda à PF que ele e seu pai, o também militar Mauro Cesar Lourena Cid, repassaram 78 mil dólares (R$ 446 mil, no câmbio atual) a Bolsonaro entre 2022 e 2023. O dinheiro teria sido obtido com a venda de joias presenteadas a Bolsonaro enquanto ele era presidente.
Lourena Cid é acusado de ter sido operador de Bolsonaro e ocultado dinheiro das joias. Ele teria guardado alguns desses presentes e oferecido-os a possíveis compradores.
Segundo Mauro Cid, Bolsoanro também teria manifestado a intenção de usar os recursos com a venda de parte desses presentes para pagar multas de trânsito por não usar capacete durante suas "motociatas" e cobrir uma indenização pedida na Justiça pela deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), segundo o portal Metrópoles.
O que Mauro Cid ganha
Eis os benefícios pleiteados por Mauro Cid:
1-perdão judicial ou redução máxima da pena, com limite de 2 anos de reclusão;
2-conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos;
3-devolução de bens e valores apreendidos, desde que comprovada sua origem lícita;
4-extensão dos benefícios para familiares próximos (pai, esposa e filha maior de idade);
5-inclusão no programa de proteção à testemunha, com garantias de segurança;
6-sigilo sobre os depoimentos e provas apresentadas até o momento oportuno
O que acontece em caso de descumprimento
Em troca dos benefícios, Mauro Cid precisaria:
1-prestar depoimentos detalhados sobre os fatos mencionados;
2-fornecer provas documentais, eletrônicas e audiovisuais para corroborar suas alegações;
3-indicar outros envolvidos nos ilícitos e fornecer informações que possam ampliar as investigações;
4-apoiar a realização de diligências, perícias e identificação de envolvidos;
5-manter sigilo sobre o conteúdo do acordo, conforme estabelecido na Lei 12.850/2013;
6-não omitir, adulterar ou destruir provas.
Caso Mauro Cid descumprisse as cláusulas do acordo, os seguintes efeitos ocorreriam:
1-revogação dos benefícios e retomada das investigações e processos criminais;
2-uso das provas fornecidas contra ele mesmo, sem possibilidade de anulação;
3-imposição de sanções adicionais, incluindo multas e agravamento da pena;
4-responsabilização por eventuais crimes de falso testemunho ou obstrução da Justiça.

Fonte: https://revistaoeste.com/no-ponto/durante-audiencia-na-qual-moraes-ameacou-prender-mauro-cid-ministro-falou-em-efeitos-contra-a-familia-do-militar/